(Por Diego EL Khouri)
Winter Bastos é um dos mais atuantes escritores desse país. Já acompanhava seu trabalho desde as primeiras edições do fanzine O Berro quando recebia em casa via correio. Zine que conheci através do grande sonetista Glauco Mattoso. Hoje ainda mantendo na ativa as publicações do Berro ele vem aprimorando sua arte e aprofundando cada vez mais nos temas de revolução e luta social que é sua marca registrada. Conheci essa alma brilhante em dezembro de 2010 em Niterói numa tarde quente carioca. Agora é a vez do Winter falar:
O inconformismo é uma das bases principais de sua literatura. De que forma ela se agrega em sua arte?
Na verdade não costumo pôr, em meus contos, objetivos políticos ou ideológicos definidos. Panfletos ou ensaios são bem mais eficientes para isso. Se algum inconformismo acaba transparecendo em minha literatura, isso se dá de maneira involuntária.
Arte necessariamente tem que ser útil?
Não. Bem, na verdade vai depender do que a pessoa entende pela palavra útil. Arte tem que ser artística, tanto quanto um triângulo tem que ter três lados. Ser artístico é provocar um deleite estético (uma “perturbação” em nossa cognição habitual) que em nada se assemelha a um passatempo ou divertimento acrítico. Essa “perturbação” é bastante proveitosa para cada um de nós, no sentido de permitir auto questionamentos e visões novas sobre o mundo e a vida. A função da arte reside nisso. Ela não é utilitária para a atual sociedade produtivista... felizmente.
Como é produzir literatura em um país de poucos leitores, ainda mais uma literatura fora da grande imprensa?
É difícil. Cursei oficinas literárias com escritores como Esdras do Nascimento, Sérgio Sant’Anna e Jair Ferreira dos Santos. Depois fiz parte de um grupo literário em que analisávamos mutuamente nossos textos literários, dando ideias uns aos outros. Arranjar tempo para ler e escrever também não é fácil. Foram muitos esforços e sacrifícios para evoluir um pouco na arte da escrita e mesmo assim poucos reconhecem. Mas a luta vale a pena. Aliás, recentemente tive a boa surpresa de saber que recebi menção honrosa no IX Concurso Municipal de Conto Prêmio Prefeitura de Niterói.
Quais as principais mudanças que ocorreram nas novas publicações do fanzine O Berro após a saída de Alexandre Mendes e Fabio da Silva Barbosa, criadores do zine ao seu lado?
Fabio e Alexandre (meus grandes amigos há quase 20 anos) saíram do fanzine que criamos juntos, para se dedicarem melhor a seus projetos individuais. Tive, então, que mudar a periodicidade de “O Berro” de mensal para bimestral. Depois ele se tornou oficialmente aperiódico, mas, na prática, tem saído a cada dois meses aproximadamente. No mais, a publicação continua bastante crítica, com textos políticos, algumas poesias, além de resenhas de livros e filmes.
Uma sociedade baseada no anarquismo é possível?
Uma sociedade baseada no Anarquismo é possível e necessária. A sociedade européia viveu mais de mil anos antes da formação dos Estados e nem por isso se autodestruiu. Na Ásia, África e América houve diversos exemplos de comunidades sem Estado. Comunas especificamente anarquistas (baseadas no pensamento de Piotr Kropotkin, M. Bakunin, Errico Malatesta...) também existiram e não entraram em colapso por falhas em sua estrutura. O problema é que o patronato e os governos combatem o Anarquismo, e o povo ainda não reuniu força e organização suficientes para derrotar tais opressores.
Como anda as publicações alternativas no país?
Não sei ao certo. Não tenho tido tempo suficiente para me inteirar do assunto. Torço para que estejam bem, já que as publicações convencionais são uma porcaria.
O Brasil vive uma democracia?
Não. Um país com serviço militar obrigatório, voto obrigatório e prisão de dependentes de drogas não pode ser considerado democrático nem mesmo pelos parâmetros burgueses.
Nos dê uma visão geral de seu blog Expressão Liberta.
O blog Expressão Liberta nasceu em novembro de 2009 para apresentar o que não costuma ser mostrado pelos meios de comunicação convencionais. Nele podem ser encontrados poemas, críticas literárias, notícias, letras de música, divulgação de eventos, resenhas de filmes etc. O endereço é www.expressaoliberta.blogspot.com.
Como é seu contato com outros fanzineiros do país? Há diferenças de estilo, visão e produção artística alternativa em cada estado do país?
Infelizmente meu contato com outros fanzineiros é pequeno. Às vezes mando cartas e não recebo resposta. Outras vezes o zineiro só mantém endereço virtual, o que impede que eu envie impressos.
Como anda a produção cultural no Rio de Janeiro?
Há coisas interessantes, porém muita carência também. Por um lado temos boas publicações como o “Anormal Zine”, o jornal “Transversus” e o fanzine “Pençá”, além de iniciativas ligadas à música como o Movimento Pop Goiaba em Niterói. Por outro lado, salas de cinema são fechadas uma a uma, restando apenas algumas poucas em shoppings, com filas quilométricas, ingressos caríssimos e filmes globais ou hollywoodianos idiotizantes. A maior parte dos teatros encena comédias vazias transplantadas da TV ou apresenta stand up comedy (show de humor que não tem nada de dramaturgia). É difícil encontrar peças de autores relevantes.
Quais os movimentos que participa e a função de cada um?
Comecei a participar, ano passado, de algumas reuniões de um grupo chamado OP, que tem um blog bastante explicativo acerca de sua função - http://organizacaopopular.wordpress.com/. No entanto tenho atuado pouco no momento. Também sou colaborador eventual da Federação Anarquista do Rio de Janeiro (vide www.farj.org).
A submissão é traço dessa nossa sociedade. Acredita na revolução da arte?
A arte é revolucionária, no sentido amplo, à medida que nos faz repensar valores e mostrar novas visões da alma humana e do universo como um todo. Logo acredito na revolução da arte. Mas entendo que, além desta, é necessário também uma revolução social que destrone os políticos, exproprie a classe burguesa e construa uma sociedade livre e igualitária, sem governantes e governados, proprietários e despossuídos, senhores e escravos. Para a construção desse processo, outros setores da sociedade são até mais importantes que os artistas.
Pra terminar, o que tem a dizer pra essa juventude?
Acreditem em vocês mesmos.
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